Nota sobre o ato “NÃO VAI TER TARIFA” do dia 17 de junho de 2014, na Candelária

Para o mês de Junho, aniversário de um ano da “Jornada de Junho” de 2013, que revogou aumentos nas tarifas em mais de 100 cidades no Brasil, convocamos junto com outros coletivos do Movimento Passe Livre pelo Brasil uma série de atividades que remetessem essa memória e pautasse a TARIFA ZERO durante o período de Copa do Mundo. A intenção clara é a denúncia dos efeitos perversos desse megaevento para a população pobre e trabalhadora do país. Na cidade do Rio de Janeiro, a prefeitura de Eduardo Paes removeu, sob despejos forçados, mais habitações do que os antigos governos de Carlos Lacerda (1962) e Pereira Passos (1903), ambos considerados recordistas de despejos e remoções na história da cidade. As mazelas do transporte público, que nós denunciamos tanto, intensificaram-se sob esse período. As obras para a instalação dos BRTs, além de servirem comojustificativa para remoções, foram extremamente lucrativas para os empresários, que mantiveram as frotas escassas (planejam retirar mais de 500 ônibus de circulação)e as tarifas, que impedem a livre circulação da população. O Bilhete Único, vendido como um suposto benefício aos usuários, se constitui em meio de venda e acúmulo de crédito através do pagamento antecipado de passagens. Trabalhadoras e trabalhadores gastam parte significativa de sua já limitada renda com o transporte. O aumento das tarifas amplia o problema quando aliado ao aumento nos aluguéis, contas e no custo de vida, nesse “boom” do “Brasil da Copa”. Como se não bastasse, medidas repressivas e militaristas estão ocorrendo na cidade, com nítidas feições de repressão política e social da população, como as violações de direitos praticadas pelas UPPs, instaladas com o curioso propósito de “pacificar” as favelas. Por conta do estado que se encontra o Rio de Janeiro, convocamos esse ato durante a Copa com o propósito de usar sua visibilidade para expor nossa principal reivindicação: a TARIFA ZERO nos transportes públicos.

Convocamos a concentração para a Candelária, às 17h e nunca mudamos o local de concentração. Militantes do MPL-Rio perceberam na hora do ato que indivíduos haviam dito pela internet, nas redes sociais, que a convocação havia sido transferida para Copacabana, onde acontecia o “Fifa fan fest”. Lamentamos o ocorrido, mas se tratou de um mal entendido. Mesmo com a previsão de repressão forte durante a Copa, ela foi maior do que o previsto. A concentração
do ato tinha uma enorme presença policial, que impediu sua realização. Até a faixa “NÃO VAI TER TARIFA” foi forçosamente fechada, sob ameaça dos policiais que disseram “Ou guardam ou vamos prender todo mundo”. Nesse momento tornou-se inviável prosseguir com a manifestação, que foi acompanhada de revistas, ameaças e prisões, com alegação de uso de máscaras ou simplesmente de maquiagem e latas para batucada nas performances artísticas (!). Isso fez com que convocássemos as pessoas a se retirarem dali para realizar uma rápida assembléia na Uruguaiana. Nesta, foi decidido que as pessoas iriam se deslocar para Copacabana, onde alguns diziam haver um pequeno protesto e onde teríamos mais visibilidade, já que a polícia estava aproveitando o esvaziamento do centro da cidade para agirem de forma mais agressiva e arbitraria.

Quando tentávamos seguir para Copacabana, fomos acompanhados pela PM, que insistia na hostilidade. As entradas das estações de metrô eram fechadas conforme os manifestantes se aproximavam. Quando decidimos seguir de ônibus, julgando que uma marcha a pé seria arriscada em função da ação repressora da PM, também fomos impedidos de embarcar, uma vez que sempre que parávamos em um ponto de ônibus a viatura da PM tentava fechar a rua. As pessoas caminhavam recolhidas e seguidas até a Cinelândia. Lá, os manifestantes revistamais uma vez tentaram pegar um ônibus. Embora lutemos pela tarifa zero, a ostensiva presença policial nos inibiu de qualquer ação para ocupação do ônibus. Muitas pessoas pagavam suas passagens ao embarcar quando o comandante policial mandou o motorista abrir a porta de trás. Muitos manifestantes exerceram seu direito e subiram promovendo a tarifa zero. Mas, a PM resolveu fechar as portas do ônibus e mandou o motorista não seguir viagem, dizendo que iria levar todos presos. Isso iniciou um conflito, pois os manifestantes reivindicaram descer enquanto os de fora exigiam a soltura dos companheiros. O saldo foram 7 presos para averiguação e alguns processados por desacato à autoridade. Um deles teve sua mão quebrada ao ser golpeado por PMs com cassetetes.

Entendemos que o que ocorreu com o ato no dia 17 de Junho de 2014 foi o meio de um processo de perseguição política e criminalização dos movimentos sociais. Têm ocorrido no país diversos ataques às lutas. Inquéritos e ações persecutórias têm acontecido com o intuito de constranger ou impedir as mobilizações. Em São Paulo, a PM responsabilizou inteiramente o MPL-SP pelos casos de depredação ocorridos durante o ato “NÃO VAI TER TARIFA” de lá, somente por ter feito a convocação e enviado uma carta à secretaria de segurança pública pedindo que não houvesse escolta policial, pois os manifestantes garantem a sua própria segurança. Ora, em eventos organizados pela prefeitura de São Paulo já houve mortes. Por que o poder público e empresas envolvidas não foram punidos e responsabilizados? Trata-se de uma clara manobra política para criminalizar os companheiros e companheiras. Em Goiânia, com a “OPERAÇÃO 2,80” movida pela D.R.A.C.O. (Delegacia de Repressão a Crimes Organizados), membros da “Frente de Luta Goiânia”, da qual faz parte o Coletivo Tarifa Zero Goiânia (federado ao MPL), foram intimados, agredidos verbalmente, interrogados e detidos em suas casas pela madrugada, tendo seus computadores e bens confiscados para fins de averiguação. Aqui no Rio, há o caso de Rafael Viera, morador de rua e lavador de carros, que foi preso durante a manifestação de 20 de Junho de 2013 e condenado por portar uma garrafa de Pinho Sol, alegada ser um explosivo pela justiça.

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Não vamos nos calar perante o que sofremos. O que ocorreu conosco foi uma clara tentativa de intimidação para que não pautássemos a TARIFA ZERO nos transportes públicos no Rio de Janeiro. Reforçamos aqui a nossa disposição de movimento social pelo transporte público e de unificação com todos que queiram lutar por essa pauta. Pois o nosso compromisso é com uma sociedade livre de todas as catracas e com todos os trabalhadores e trabalhadoras que são penalizados pela existência das tarifas e por esse modelo de transporte público voltado ao lucro empresarial. Desde Fevereiro de 2014, tivemos a nossa jornada de lutas, contra o aumento das passagens de ônibus, interrompida por uma tragédia promovida pela Polícia Militar. Essa decidiu sabotar a qualquer custo a ação direta do “catracasso”, que estava tendo um apoio popular crescente, quando jogou bombas e atacou os manifestantes e passageiros na estação Central do Brasil. Isso desencadeou no conflito que provocou a morte por atropelamento do camelô Taslan Aciolly e por um rojão que acertou a cabeça do cinegrafista Santiago Andrade, onde o julgamento dos dois jovens responsabilizados está até hoje sendo usado para fins de terror sobre as lutas sociais. Esses fatos precisam ser lembrados, pois foram seguidos de uma forte perseguição midiática e policial aos movimentos sociais. Principalmente, promoveram uma repressão e silencio sobre o absurdo aumento na tarifa de ônibus para 3 REAIS, que foi condenado por técnicos do TCM (Tribunal de Contas do Município), que afirmavam que a tarifa deveria REDUZIR para R$2,50. Os aumentos na passagem de trem e metrô ocorreram em seguida, depois do então governador Sérgio Cabral ter prometido congelar as tarifas.

Sabemos que a perseguição e a repressão não são de hoje. Isso não foi e nem será suficiente para nos fazer parar. Estaremos nas ruas, bairros, favelas e onde for necessário para nos fortalecer e prosseguir na luta. Temos não só o direito de manifestação e de organização ao nosso lado, mas também toda uma população que sofre com esse modelo de transporte público. A ação do poder público e da polícia só nos revela o seguinte: os “de cima” tremem de medo das mobilizações populares. O que os empresários, a mídia corporativa e os governos querem é impedir o crescimento da adesão aos movimentos sociais, criando um clima de terror e transformando os militantes em suspeitos criminais. A resposta que daremos a isso é prosseguir na mobilização cada vez maior. Por isso, sempre convocaremos todos que queiram lutar pelo direito de ir e vir, pela TARIFA ZERO e pelo direito à cidade. Enquanto houver catracas, estaremos nos organizando e lutando.

Força entre nós, guerra às tarifas! Por uma vida sem catracas!

Movimento Passe Livre – Rio de Janeiro

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